
Tudo fica parado. Quieto.
Os trabalhadores olham à procura de onde tinha vindo o grito de dor.
Sinto um apertar no peito e, de repente, outro grito seguido de barulhos e mais gritos. Corro pelo meio da área dos trabalhadores e desço por um corredor circular feito de degráus de pedra que vai dar à secção do andar de baixo.
Um casal vestido em trapos apontam-me por onde seguir.
Não consigo decifrar as vozes, nem o quero. Só quero chegar à origem do grito o mais rápido possivel.
Este barulho vai atraí-los até nós!
Vejo um aglomerado de pessoas junto de duas mulheres e um homem na zona dos aposentos. Mal me aproximo, as pessoas afastam-se. Reparo no homem de barbas brancas e feições fortes a segurar na mão de uma miúda, que nao deve ter mais do que quinze anos. Ela está de pernas abertas e morde um pedaço de madeira, ao mesmo tempo que da sua boca conseguem fugir gritos. A dor deve ser demasiada para que a consiga suportar, por isso tento não pensar que esta desordem toda pode eventualmente atrai-los.
Eles que venham!
A outra mulher, idosa, com uma cicatriz ainda recente na face segura-lhe nas pernas e tenta-lhe transmitir reconforto e força através de palavras calmas e sinceras. Olho para ela e ela para mim e, nos seus olhos vejo o medo e a ansiedade. Ajoelho-me ao pé da criança e passo a minha mão suavemente pela sua testa. Tem a pele suada e amarela.
Vai morrer.
Como te chamas querida? - Pergunto eu afagando os seus cabelos.
Te... Teresa, senhor... - Responde ela com os olhos muito abertos e soluços na voz enquanto as suas mãos agrarravam com mais força a manta grossa debaixo do seu corpo.
O homem começa a chorar no momento que os olhos dela vão revirando e o sangue não pára de jorrar do seu sexo. Este é já o quinto aborto que acontece só neste mês, mas felizmente as outras mulheres tiveram mais sorte, conseguindo manter-se vivas. Desde que cá estamos ainda não houve um único parto em que a criança tivesse sobrevivido.
A velha deixa de lhe segurar nas pernas ao mesmo tempo que Teresa lança um grito agudo, seguido por um último suspiro.
Ela morre.
Todas as pessoas baixam a cabeça. O homem chora no seu peito. A idosa levanta-se e afasta-se indo lavar as mãos numa bacia com água, ali ao pé. Pouso a mão no ombro do homem.
Era sua filha? - Pergunto.
Era sim...a minha bébé. O meu amor! - Palavras que lhe saem por entre lágrimas.
O pai da criança onde está? Eu aviso-o da perda. - Não sabendo mais o que dizer ou fazer.
Sou eu... - Responde o homem. - Sou eu. Era eu o pai da criança... - Levantando a cabeça e olhando nos meus olhos com a cara encharcada de lágrimas. - Eu amava-a...
Olho directamente para ele. Sussurros e frases de reprovação começam a subir de tom nas vozes dos sobreviventes que nos rodeiam. Vejo a imagem da minha filha. Vejo a sua morte.
Sem pensar agarro o homem pelos cabelos e esmurro-o violentamente na boca com o punho cerrado. Sinto os dentes dele a ficarem cravados nos nós dos meus dedos. Não digo mais nada. Não consigo. Afasto-me enquanto o ouço gritar e chorar o quanto a amava e ainda a ama. As minhas mãos não conseguem parar de tremer. A multidão abre caminho para eu passar e vejo a velha parada encostada á parede. Não temos médicos, nem quem o tivesse sido antes dos ataques, o que faz com que nós tenhamos que nos contentar com estas beatas. Medicamentos não existem e um assalto ao que resta do antigo hospital está fora de questão. Da última vez que um grupo tentou entrar lá foi completamente chacinado. Desde esse dia fomos observando o edifício e aprendendo que os seres têm inteligência suficiente ao ponto de não sairem de lá, de dia ou de noite, porque sentem que estamos vivos. Mesmo não sabendo a nossa localização, vão-nos retirando os bens de primeira necessidade, para nos irem matando aos poucos.
Observo a velha ainda a esfregar as mãos a tentar tirar o sangue que já lá não existe.
Arranja o corpo por favor. Amanhã faremos o funeral. - Digo eu á beata.
Claro que trato dela...ela era minha filha.
Continua...
Texto por.: Daniel Lopes
Agradecimentos aos meus amigos que têm vindo aqui comentar, ou apenas a dar-se ao trabalho de ler, mas, em especial um grande beijinho e um obrigado à Sofia por me corrigir os erros e apoiar-me como se não houvesse amanhã.
Que isto seja um degrau que dê a uma escada para o nobel da literatura. : P
E em "Soundtrack" recomenda-se vivamente Red Sparowes para quem ler estas palavras.
: )
Os trabalhadores olham à procura de onde tinha vindo o grito de dor.
Sinto um apertar no peito e, de repente, outro grito seguido de barulhos e mais gritos. Corro pelo meio da área dos trabalhadores e desço por um corredor circular feito de degráus de pedra que vai dar à secção do andar de baixo.
Um casal vestido em trapos apontam-me por onde seguir.
Não consigo decifrar as vozes, nem o quero. Só quero chegar à origem do grito o mais rápido possivel.
Este barulho vai atraí-los até nós!
Vejo um aglomerado de pessoas junto de duas mulheres e um homem na zona dos aposentos. Mal me aproximo, as pessoas afastam-se. Reparo no homem de barbas brancas e feições fortes a segurar na mão de uma miúda, que nao deve ter mais do que quinze anos. Ela está de pernas abertas e morde um pedaço de madeira, ao mesmo tempo que da sua boca conseguem fugir gritos. A dor deve ser demasiada para que a consiga suportar, por isso tento não pensar que esta desordem toda pode eventualmente atrai-los.
Eles que venham!
A outra mulher, idosa, com uma cicatriz ainda recente na face segura-lhe nas pernas e tenta-lhe transmitir reconforto e força através de palavras calmas e sinceras. Olho para ela e ela para mim e, nos seus olhos vejo o medo e a ansiedade. Ajoelho-me ao pé da criança e passo a minha mão suavemente pela sua testa. Tem a pele suada e amarela.
Vai morrer.
Como te chamas querida? - Pergunto eu afagando os seus cabelos.
Te... Teresa, senhor... - Responde ela com os olhos muito abertos e soluços na voz enquanto as suas mãos agrarravam com mais força a manta grossa debaixo do seu corpo.
O homem começa a chorar no momento que os olhos dela vão revirando e o sangue não pára de jorrar do seu sexo. Este é já o quinto aborto que acontece só neste mês, mas felizmente as outras mulheres tiveram mais sorte, conseguindo manter-se vivas. Desde que cá estamos ainda não houve um único parto em que a criança tivesse sobrevivido.
A velha deixa de lhe segurar nas pernas ao mesmo tempo que Teresa lança um grito agudo, seguido por um último suspiro.
Ela morre.
Todas as pessoas baixam a cabeça. O homem chora no seu peito. A idosa levanta-se e afasta-se indo lavar as mãos numa bacia com água, ali ao pé. Pouso a mão no ombro do homem.
Era sua filha? - Pergunto.
Era sim...a minha bébé. O meu amor! - Palavras que lhe saem por entre lágrimas.
O pai da criança onde está? Eu aviso-o da perda. - Não sabendo mais o que dizer ou fazer.
Sou eu... - Responde o homem. - Sou eu. Era eu o pai da criança... - Levantando a cabeça e olhando nos meus olhos com a cara encharcada de lágrimas. - Eu amava-a...
Olho directamente para ele. Sussurros e frases de reprovação começam a subir de tom nas vozes dos sobreviventes que nos rodeiam. Vejo a imagem da minha filha. Vejo a sua morte.
Sem pensar agarro o homem pelos cabelos e esmurro-o violentamente na boca com o punho cerrado. Sinto os dentes dele a ficarem cravados nos nós dos meus dedos. Não digo mais nada. Não consigo. Afasto-me enquanto o ouço gritar e chorar o quanto a amava e ainda a ama. As minhas mãos não conseguem parar de tremer. A multidão abre caminho para eu passar e vejo a velha parada encostada á parede. Não temos médicos, nem quem o tivesse sido antes dos ataques, o que faz com que nós tenhamos que nos contentar com estas beatas. Medicamentos não existem e um assalto ao que resta do antigo hospital está fora de questão. Da última vez que um grupo tentou entrar lá foi completamente chacinado. Desde esse dia fomos observando o edifício e aprendendo que os seres têm inteligência suficiente ao ponto de não sairem de lá, de dia ou de noite, porque sentem que estamos vivos. Mesmo não sabendo a nossa localização, vão-nos retirando os bens de primeira necessidade, para nos irem matando aos poucos.
Observo a velha ainda a esfregar as mãos a tentar tirar o sangue que já lá não existe.
Arranja o corpo por favor. Amanhã faremos o funeral. - Digo eu á beata.
Claro que trato dela...ela era minha filha.
Continua...
Texto por.: Daniel Lopes
Agradecimentos aos meus amigos que têm vindo aqui comentar, ou apenas a dar-se ao trabalho de ler, mas, em especial um grande beijinho e um obrigado à Sofia por me corrigir os erros e apoiar-me como se não houvesse amanhã.
Que isto seja um degrau que dê a uma escada para o nobel da literatura. : P
E em "Soundtrack" recomenda-se vivamente Red Sparowes para quem ler estas palavras.
: )
3 comentários:
Va pronto... Ta melhor... ficar em suspense e que nao!!! xD vamos la ver quando vem mais paginas, fico a espera!
beijinho grande.
(obrigada pelo apoio!)
Uma história, seja ela verídica ou não, dá sempre muito prazer ler desde que bem escrita.
Tu consegues transportar para o papel as tuas histórias de uma forma incrível, com mais ou menos sangue... :)
A história claro tem que continuar, porque o suspense já anda no ar e não conitunar seria um crime. E tu claro também tens que continuar a escrever, não só esta, mas muitas mais histórias.
Eu vou estar sempre a apoiar-te.
ps.: ao que parece isso de escrever também se pega...no entanto as minhas metem menos sangue e menos tragédia. :)
Beijinhoooo
Cada vez melhor...Uma parte de mim quer muito visitar a tua Sintra e o teu asilo subterrâneo...Quem sabe um dia os nossos caminhos se encontrem.
Continua irmão, terás sempre aqui alguém com quem podes contar.
Abraço
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